Aprisionada Pelo Conde
Aprisionada Pelo Conde - Excerto Do Livro
Capítulo Um
— Não! Martin, a criança não, ela é só um bebê. Não me importo com o que você faz comigo, mas… deixe ela, Martin. Oh Martin, não!
A voz de sua mãe se transformou em um grito de agonia quando um golpe brusco do punho de seu pai a acertou na bochecha e a enviou cambaleando contra a cômoda de madeira. Um jarro azul com leite balançou e caiu, quebrando-se em pedaços irregulares no chão de azulejos da cozinha.
O momento ficou congelado para sempre na memória de Lucy Swift: o golpe, o jarro balançando, a explosão branca no chão, a visão de sua mãe de joelhos, uma marca carmesim no rosto já ficando azul, soluçando enquanto pegava os cacos afiados de cerâmica, e seu pai murmurando um juramento enquanto balançava instável em direção à porta.
Olhando para ele agora, ouvindo-o assobiar enquanto escovava a égua baia em um esplendor reluzente com movimentos circulares e metódicos, Lucy mal podia acreditar que o bêbado brutal e esse homem cuidadoso e terno eram a mesma pessoa — o pai dela. No entanto, sua lembrança mais antiga não era uma fantasia.
Cenas semelhantes tinham se repetido várias vezes durante os dezoito anos de sua vida. Elas tinham levado sua mãe, Ann, à velhice prematura. Aos trinta e oito anos, ela estava com o cabelo grisalho e abatida, seu corpo encolhido como se fosse por seus esforços para se proteger das palavras violentas e golpes do marido, o rosto marcado por uma vez, onde em um ataque excepcional de embriaguez, acertou-a com um chicote de montaria.
Lucy amou a mãe com um fervor que a levou, desde muito jovem, a enfrentar Martin Swift. Uma vez, aos quatro anos, ela deu golpes nos joelhos dele com seus punhos infantis enquanto ele tentava derrubar a frágil Ann, convencido de que ela estava escondendo um jarro de cerveja dele. Sair em defesa ardente de sua mãe muitas vezes tinha lhe rendido uma surra dolorosa, mas ela sabia que também tinha o respeito relutante de seu pai, especialmente quando se tratava de cavalos. Não como seu irmão, Geoffrey.
Como se lesse seus pensamentos, Martin Swift olhou do cavalo inquieto para a filha.
— Aposto que Geoffrey não teria feito um trabalho tão bom quanto este, não é? — perguntou ele, lançando um olhar de admiração para seu próprio trabalho. Na empoeirada luz amarela do estábulo, a bela pele da égua brilhava como a luz da lua na neve. Ele não esperava uma resposta, mas desviou-se para o outro lado e retomou suas escovadas hipnóticas.
Lucy o observou enquanto ele trabalhava. Aos quarenta e um anos, apesar de sua excessiva indulgência em cerveja e licores, Martin estava no auge, não era um homem alto, mas rijo e forte, com cabelo preto e olhos azuis que traíam sua ascendência irlandesa, embora ele, e seu pai antes dele, tivessem nascido na mesma pequena vila de Lancashire onde os Swifts ainda viviam. Somente sua tez corada e castigada pelo tempo e o nariz quebrado exibindo um mapa de pequenas veias vermelhas, davam uma pista de sua vida ao ar livre. Dentro de casa, vestido, com o corpo limpo dos cheiros do estábulo, ele podia, com pouca luz, passar pelo cavalheiro que pensava ser.
Geoffrey não era nem um pouco parecido com o pai, refletiu Lucy, enquanto mastigava distraidamente um pedaço de palha fresca. Ela sentia muita falta do irmão, apesar de já terem passado três anos desde que ele deixara Prebbedale, fugindo aos catorze anos dos maus-tratos de seu pai. Ela tinha ajudado em sua fuga e não se arrependia, apesar de, por essa ação arriscada, ter se privado de seu mais leal suporte e confidente, provavelmente para sempre. Porque Geoffrey, o mais querido, gentil e bem-humorado, com seus cachos loiros e natureza poética, era muito mais parecido com sua mãe do que Lucy ou Helen.
— Aquele pequeno maricas chorão — era a maneira habitual e ridícula de seu pai de descrevê-lo. Nascido com um medo profundo de todos os animais de grande porte, Geoffrey corria para o esconderijo mais próximo sempre que seu pai o procurava para levá-lo aos estábulos e tentar lhe ensinar alguns conhecimentos sobre cavalos. Martin Swift era conhecido e respeitado em todo o condado e além, por sua habilidade em criar, manejar, domar e treinar cavalos. Duques e condes o chamavam e pediam conselhos antes de comprar um cavalo de corrida puro-sangue ou um par de cavalos de carruagem, sabendo que seu julgamento era sólido e infalível.
— Não-o-o — ele diria lentamente, balançando a cabeça enquanto um belo exemplar desfilava diante dele. — Esse não. O jarrete esquerdo é fraco. — Lhe desapontaria ao longo dos oitocentos metros. — E Lorde Highfalutin’ dispensaria o animal e lhe passaria um soberano por lhe salvar cinquenta.
A égua cinza, Beauty Fayre, bateu um casco e bufou, quebrando o devaneio de Lucy. Quem sabia onde Geoffrey estava agora? Nas Índias Orientais, talvez, tendo conseguido passagem em um navio comercial; ou talvez estivesse usando o uniforme da marinha, fazendo a vigia enquanto compunha mentalmente uma ode ao mar agitado. A menos que ele estivesse… Lucy não conseguiu considerar o pior destino de todos.
Um som atrás dela, como o arrastar de um cachorro na palha, a fez virar a cabeça. Um ombro e metade de um rosto ansioso apareceram no canto do batente da porta, enquanto Ann Swift tentava chamar a atenção da filha sem atrair a atenção do marido. Dando um aceno quase imperceptível, Lucy deu dois passos silenciosos para trás em direção à porta e virou rapidamente na esquina do edifício, tentando não prender a saia em um prego saliente.
Ela tinha esquecido totalmente que sua irmã, junto do marido John e os filhos gêmeos Toby e Alexander, os visitariam naquela tarde. Seu coração afundou com o pensamento de ter que brincar de tia com as crianças, lutar com seu cérebro para pensar em respostas para os comentários sugestivos de John e ouvir os resmungos previsíveis e enfadonhos de sua irmã sobre criados, crianças e a última moda de Londres. Era sempre a mesma coisa.
— Não está casada ainda, nossa Lucy? — John ladraria, na sua tentativa brusca de um tom jocoso. Ela esperaria para ver as gotas de suor aparecerem ao longo de sua testa enquanto seus olhos passavam lascivamente por seu corpo.
— Realmente, mãe, eu simplesmente não consigo entender como Helen consegue aturar ele. Ele é um animal — reclamou Lucy para a mãe.
— Calada, garota. Ele é um bom homem. Ela poderia ter ficado com alguém muito pior — respondeu Ann em sua voz baixa, como um sussurro derrotado. Elas já tinham tido essa conversa muitas vezes antes. Era um ritual de aquecimento para todas as visitas de Helen.
— Mas ela nunca teria se casado com ele, com certeza, se não quisesse tanto ficar longe do pai — persistiu Lucy. — Ela só tinha dezesseis anos. Quem sabe por quem ela teria se apaixonado se tivesse tido a chance? Ela nem mesmo conhecia John Masters. Papai arranjou tudo. Eu acho nojento — como levar um garanhão para uma égua.
* * *
— Lucy! — Ann estava chocada, mas divertida, também. Em particular, ela achou que a opinião de Lucy era bastante correta. Ela estendeu a mão e ajeitou uma mecha de cabelo castanho de Lucy, enquanto as duas sentavam lado a lado no banco perto da janela, observando a chegada dos visitantes. Lucy era tão parecida com o pai, com suas costas retas, os olhos azuis alertas, os lábios carnudos e curvos, e o jeito claro de falar.
Havia uma vivacidade em Lucy que lembrava a Ann seu primeiro vislumbre de Martin, quando ele estava no mercado de Weynford, sua cidade natal, vinte e três anos atrás. Para ela, ele parecia se destacar de seus companheiros como se estivesse cercado de uma espécie de brilho, indetectável ao olho humano, mas capaz de ser captado por algum sexto sentido.
Mesmo agora, apesar dos anos de tormento e agonia que havia sofrido em suas mãos, abuso que lhe causara problemas de saúde e um tremor nervoso permanente, ela ainda estava admirada por ele, ainda capaz de sentir o mesmo assombro sempre que ele a olhava gentilmente ou lhe dava um de seus sorrisos especiais, meio atrevidos, meio amorosos. Seja lá o que ele possuía que o dava aquele poder único sobre pessoas e animais, Lucy tinha herdado, e às vezes Ann temia pelo que a vida reservava para sua filha mais nova. Particularmente agora, com Martin tão ansioso com seu estado de solteira.
Eles tinham discutido isso na cama na noite anterior.
— Maldita seja a criada da cozinha! — se queixou Martin, tomando um gole de sua cerveja quente noturna apenas para encontrá-la gelada. — Livre-se dela amanhã de manhã. E o que vamos fazer em relação à Lucy?
Ann, acostumada às mudanças abruptas de assunto do marido, suspirou e se afastou para o outro lado do colchão de penas irregular, tentando não provocar a ira do marido por levar muito das cobertas com ela.
— E então? — ele estalou, estendendo a mão no escuro e cravando os dedos dolorosamente no ombro dela. — E então? Helen tem vinte um anos e já tem dois bons filhos. Sou motivo de chacota na vizinhança, tendo essa moça ainda presa em minhas mãos aos dezenove anos. Ora, ontem mesmo aquela maldita Appleby teve a coragem de sugerir que talvez ninguém a quisesse porque ela era mercadoria suja. Eu chicoteei a maldita para ensiná-la a segurar a língua. Ainda assim, um insulto é um insulto. Ela está em nossas mãos há tempo suficiente, comendo nossa comida, ocupando espaço no lugar, andando às voltas como um… com um grande rapaz.
Ann sentiu uma risada por dentro, sabendo muito bem que Martin tratava sua filha mais nova quase exatamente como um filho. Ela também sabia que Martin achava Lucy uma grande ajuda com os cavalos, pois ela herdara cada parte de seu talento natural. Até cavalos não domados se acalmavam e a deixavam se aproximar deles. Era como se algum entendimento secreto passasse entre o animal e a garota. Às vezes, ela desejava que Lucy tivesse nascido menino. Ela teria ido longe na vida, disso Ann não tinha dúvida — e que a vida teria sido muito mais fácil também.
Martin continuou seu monólogo:
— Já vi como todos olham para ela — comerciantes, cavalariços, cavalheiros respeitáveis. Todos eles gostariam de colocar as mãos nela. Já podíamos tê-la casado vinte, trinta vezes. Se eu não tivesse sido tão mole com ela, cedendo toda vez que ela dizia: “Não pai, não vou me casar com ele… Não, pai, eu não gosto dele…” Mimada e voluntariosa, é isso o que ela é. Bem, já tive o suficiente. Há um bom homem que tenho em mente para ela. Não há melhor. Ela se casará com ele e isso será o fim, nem que eu mesmo tenha que levá-la.
Ann, apertando e agarrando nervosamente as roupas de cama, tinha encontrado fôlego para sussurrar:
— Quem poderia ser?
Sua resposta deu a ela sentimentos muito confusos e a fez ficar acordada a maior parte da noite
— O velho Holy Joe. O reverendo Pritt.
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